País pode ter expansão fiscal maior este ano, diz economista

Por Manoel de Castro Pires – Valor Ecônomico 

A contração das despesas públicas da União no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff foi seguida de forte expansão fiscal no ano passado, com crescimento dos gastos federais equivalente a 1,59% do Produto Interno Bruto. A maior parte da pressão financeira sobre o governo Michel Temer em 2016 veio das áreas de previdência social (0,84%) e de custeio e investimento (0,69%), indica levantamento do Instituto Brasileiro de Economia (Ibre), da FGV.

"A tendência é de que esse percentual [de expansão, de 1,59%,] seja maior no 2º ano do governo Temer", diz Manoel Carlos de Castro Pires, economista responsável pela compilação e análise dos dados e ex-secretário de Política Econômica do ministério da Fazenda. "Temer assumiu o país após um período de repressão financeira insustentável". O ajuste fiscal empreendido por Dilma em seu segundo mandato resultou numa retração da despesa pública equivalente a 0,04% do PIB. Pode parecer pouco, mas essa foi a diminuição mais expressiva desde a administração de Fernando Collor de Mello, no início dos anos 90. Na época de Collor, esclarece Pires, a inflação alta contribuía para diminuir o valor real da despesa do governo.

Aos efeitos da inflação somavam-se também fatores como repressão financeira e ajuste por meio de privatizações – as estatais deficitárias recebiam aportes frequentes de capital. No mandato de Dilma iniciado em 2015, o ajuste dos gastos se deu na rubrica de custeio e investimento, que retrocedeu 0,91%.

Os números compilados pelo Ibre mostram que, para cada período de contração fiscal desde 1985, houve uma posterior expansão de gastos, compensando pelo menos em parte os efeitos dos cortes de despesa. "Parte do corte de gastos é permanente, mas outra parte é resultado de repressão financeira", esclarece Pires, economista à frente do projeto Observatório de Finanças Públicas, previsto para estrear em outubro. Ao avaliar o governo Temer, Pires considerou apenas o ano fechado de 2016, apesar de Dilma ter sido afastada da presidência em maio. "As decisões relevantes de expansão fiscal foram tomadas na gestão dele", diz.

Na comparação entre Temer e seus antecessores, o pemedebista foi o presidente que mais ampliou a despesa pública desde Itamar Franco, segundo os dados compilados. "Existe uma pressão do mercado para que Temer faça o ajuste fiscal. E, ao mesmo tempo, há uma brutal pressão da base política para que o Estado faça rodar a máquina e atenda as demandas de parlamentares, governadores e prefeitos", resume o cientista político Antonio Lavareda. A comparação entre Temer e os seis presidentes que o antecederam desde 1985 é prejudicada – admite Pires – pela queda acentuada no PIB registrada no ano passado (-3,6%).

"O fato de o PIB ter caído é importante, mas não decisivo nessa análise", argumenta ele. Como a análise do Ibre se resumiu, no caso de Temer, apenas a 2016, a tendência é de que os efeitos da expansão fiscal possam ser diluídos até o fim do mandato. Especialista em finanças públicas, a economista Selene Peres ressalta que a combinação dos efeitos resultantes das variações do PIB e das despesas públicas pode produzir distorções. Como exemplo, Selene cita a "diminuição" (como proporção do PIB) na despesa com pessoal durante os dois mandatos do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o primeiro de Dilma.

As sucessivas quedas medidas pelo Ibre – equivalentes a 0,40%, 0,09% e 0,49% do PIB, respectivamente – são na verdade efeitos da expansão da economia, sustenta Selene. "Essas quedas passam a ideia de que a política fiscal foi restritiva nos governos de Lula e no primeiro mandato de Dilma, quando foi exatamente o contrário que ocorreu", diz, acrescentando que o efeito cumulativo dos recentes ciclos de expansão da despesa pública gera reflexos na gestão Temer. "Estamos pagando a conta da Copa do Mundo e da Olimpíada até hoje."

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