Bolsonaro, Lula e as mudanças nas previsões para a eleição presidencial

Época
Resiliência de deputado e transferência imediata de votos de ex-presidente foram subestimadas

Um dos livros mais corajosos lançados em 2018 foi O voto do brasileiro, escrito pelo cientista político Alberto Carlos Almeida. Uso a palavra corajoso da mesma forma que o economista Samuel Pessoa o faz no prefácio da obra. Ele enaltece o autor por tentar acertar em maio quem iria para o segundo turno da corrida presidencial quatro meses depois.

Em 140 páginas, Almeida deixa claro que projetava um round final entre PT e PSDB nas urnas. Segundo a sua tese, o Nordeste despejaria votos em um candidato indicado por Lula e São Paulo priorizaria um tucano, seguindo a lógica das disputas ao Planalto desde 2006.

Nos últimos doze anos, aponta Almeida, o Brasil seguiu a tendência de democracias ocidentais como Espanha, Alemanha e França, onde as regiões mais pobres votam regularmente em partidos estruturados de centro-esquerda e as menos pobres nos de centro-direita.

Os resultados das últimas pesquisas eleitorais de Ibope e Datafolha fizeram Almeida rever parte dos seus palpites. Enquanto Geraldo Alckmin (PSDB) segue patinando com índices abaixo dos dois dígitos, Jair Bolsonaro (PSL) se consolidou em primeiro nas pesquisas com 28% e Fernando Haddad (PT) isolou-se na vice-liderança, variando entre 18% e 16% dependendo do levantamento.

"Modifico minha previsão de segundo turno de PT x PSDB para PT x Bolsonaro. Mantida a disputa de vermelhos versus azuis. A distribuição de votos social e regional seguirá o padrão dos mapas de meu último livro", escreveu Almeida em seu Twitter na última quarta-feira. Para o cientista político, vermelho seria o PT (de forte penetração popular) e azul Bolsonaro (com entrada na classe média) – esta, uma posição ocupada pelos tucanos nas últimas eleições.

Almeida, ressalte-se, não foi o único a admitir que errou ao não detectar o silencioso crescimento de Bolsonaro em dois anos. Lembremos: em dezembro de 2016, o Datafolha apontava o deputado com apenas 9% das intenções de votos, atrás de Lula (25%), Marina Silva (15%) e Aécio Neves (11%). Durante o ano passado, Bolsonaro foi crescendo nas pesquisas, mas a verdade é que sempre foi subestimado de alguma forma.

Em 16 de outubro de 2017, o cientista político Antonio Lavareda cravou o seguinte em uma palestra na Associação Comercial de São Paulo (ACSP): "Bolsonaro não tem condição de ganhar uma eleição de segundo turno", disse. Esse ano, em julho, Carlos Augusto Montenegro fez apostas semelhantes para o colunista de O GLOBO, Bernardo Mello Franco: “Ele (Bolsonaro) perde para qualquer um no segundo turno. O voto do Bolsonaro não é ideológico de direita. É como o voto nulo, no Enéas ou no Tiririca”, sentenciou.

No mesmo mês, também foi possível ler no jornal Valor Econômico uma entrevista do estatístico Paulo Guimarães, espécie de guru do DEM, com um papo de que Bolsonaro estava perdendo e ao mesmo tempo ganhando 20% de votos a cada mês (ou seja, estaria estagnado nas pesquisas).

A reta final do primeiro turno chegou e pelo menos Lavareda e Montenegro já voltaram atrás nos seus prognósticos. Ambos passaram a cogitar até uma vitória de Bolsonaro já no próximo dia 7. Ao jornalista Guilherme Amado, de O GLOBO, Lavareda disse considerar "concreta" a possibilidade: "Numa eleição com taxa de abstenção tão alta como esta, candidatos que têm 30, 32, 33% têm chances de ganhar no primeiro turno. Seja de direita, seja de esquerda, quem alcança esse patamar num pleito em que a alienação (abstenção) deve chegar a 30%, pode ter mais do que 50% dos votos válidos".

Também ao GLOBO, Montenegro ajustou seu discurso sobre o fim da eleição ocorrer já no próximo dia 7: “Vai depender do voto útil. Do jeito que a população está chateada, pode haver um movimento para decidir logo”. Não existe nenhuma notícia até o momento sobre revisões de conceitos de Paulo Guimarães.

A subida meteórica de Haddad nas pesquisas também não estava nos cálculos do mundo político. Lembro aqui de duas conversas de meados de agosto que tive com Carlos Lupi, presidente do PDT, e Rodrigo Maia (DEM), presidente da Câmara dos Deputados.

Lupi era da tese de que a transferência de votos para Haddad não seria tão efetiva no Nordeste, região do seu candidato a presidente, Ciro Gomes. Pelo seu raciocínio, o nordestino não aceitaria tão automaticamente um 'dedaço' de Lula para um paulista com cara de tucano. Por ora, o palpite está errado: segundo o Ibope, Haddad já bateu 31% de intenções de votos em menos de duas semanas no Nordeste e a tendência é que cresça ainda mais na região.

Já Rodrigo Maia apostava que Lula erraria o timing para a transferência de votos se insistisse na sua candidatura de dentro da prisão mesmo com o início do programa eleitoral na TV, em 31 de agosto. O filho de Cesar Maia errou também. O petista só foi anunciado candidato dez dias depois e, rapidamente, passou a crescer um ponto percentual por dia.

Restam ainda duas semanas para o dia D da votação e as campanhas, especialmente a de Geraldo Alckmin, estão de olho em uma última cartada contra Bolsonaro: a tal confusão criada a partir da proposta do economista Paulo Guedes sobre a criação de um imposto nos moldes da antiga e impopular CPMF, além da unificação das alíquotas do Imposto de Renda.

Teriam estas ideias o poder de ser um tiro no pé que faria Bolsonaro despencar? Em 2012, por exemplo, Celso Russomano, candidato à prefeitura de São Paulo, deixou de ir para o segundo turno após defender que o passageiro de ônibus paulistano pagaria, em seu governo, uma tarifa proporcional ao trecho percorrido.

Outra dúvida para a reta final do primeiro turno: terá Ciro Gomes fôlego para resistir a Haddad ou as próximas pesquisas já trarão um quadro irreversível?

A rodada de novos palpites de analistas e integrantes do mundo político já começou.